Rodovia Washington Luís pode aproveitar o tempo perdido no trânsito para tomar o café da manhã. É que na estrada, ao longo do enorme engarrafamento que se forma a partir da altura de Caxias, é fácil encontrar homens e mulheres com garrafas térmicas cheias de cafezinho fresco andando entre os veículos. Alguns vendem até pão com manteiga, de olho num dinheiro a mais em meio à crise. Os que enfrentam o congestionamento da BR-101 (Niterói-Manilha) diariamente também estão bem servidos. Na via, sempre nos pontos mais lentos do tráfego, há uma vendedora de café que bate ponto de segunda a sexta-feira. Para enganar o estômago da clientela, ela oferece até biscoitinhos e nacos de batata-doce e inhame como cortesia.
Diante da escassez de empregos formais, esses ambulantes enxergam um bom negócio no cafezinho servido a passageiros e motoristas durante longas esperas no trânsito.
Dá um cafezinho aí, amigo! - gritava e piscava os faróis o motorista de um Ford Ka, preso no engarrafamento da última terça-feira, na altura da Favela Beira-Mar, na Washington Luís.
Com agilidade, Jeferson dos Santos, de 18 anos, saiu correndo do outro lado da pista e, já entornando o café no copo, entregou a bebida. Com rapidez, jogou o dinheiro numa bolsa a tiracolo, já partindo para atender um caminhoneiro à frente. Este vai e vem foi até às 8h40m, quando o engarrafamento começou a se dissipar.
Estudante do ensino médio de uma escola municipal, ele integra um grupo de trabalhadores que ganha a vida vendendo o desjejum para motoristas e passageiros. Semanalmente, recebem R$ 150 por cerca de quatro horas de jornada, de segunda a sexta-feira.
- É um trabalho bom, dá para ganhar um salário - comenta ele, já correndo em direção a mais um cliente.
Para se destacar, a turma trabalha com uma camiseta laranja, onde se lê "Irmão do Café. Jesus te Ama". Só Paulo Sérgio Costa Pinto, de 34 anos, usa terno e gravata. Pastor da Igreja Pentecostal Deus é Luz e Maravilha, Paulo é o líder dos vendedores: foi ele quem descobriu o nicho de mercado.
- Trabalhava com ferro-velho e, quando o Jardim Gramacho fechou, fui para a construção civil, mas não me acostumei. Vendia água no sinal no verão. Um dia, pedi a Deus que me desse uma ideia de algo que pudesse vender no calor e no frio, e ele me disse: café - conta.
Paulo conta que vende em média de 80 litros de café preto por dia. Fora os 14 litros de chocolate quente e oito litros de café com leite. Todas as doses a R$ 1. Eles também vendem pão com manteiga (R$ 1), sanduíche de queijo ou mortadela (R$ 2) e pão com ovo (R$ 2,50).
- Compra gente de BMW, de Mercedes - vangloria-se o caxiense, que começa a preparar o café e o chocolate quente, no madrugada, por volta das 2h.
Miranildes Ferreira Aranha, de 57 anos, a Tia Mira, trabalha sozinha e vai vender cafezinho onde o engarrafamento a leva. Já foi vista na subida e na descida da Ponte Rio-Niterói, perto do Gasômetro e na Leopoldina. Mas ela prefere os congestionamentos da Niterói-Manilha, onde é figura conhecida. Está sempre fantasiada (de Chaves e Dona Florinda, com orelhas de coelho, de palhaço...). Na quinta-feira, vestia uniforme preto, avental, gravata e luvas e carregava um microfone de cabeça.
Mandando beijos para quem passa, diz que "vende alegria, e junto vai o cafezinho". Naquele dia, trabalhava perto do supermercado Carrefour quando soube que uma carreta havia tombado no Portão do Rosa. Pegou carona em uma van e foi atrás da freguesia.
- Faço questão de sorrir e falar palavras bonitas. Muita gente passa e diz que eu alegro o dia - comenta ela, que vende cafezinho e chocolate quente a R$ 2, e, se tem dinheiro, oferece biscoito e pedacinhos de batata-doce.
Moradora do Gradim, em São Gonçalo, Tia Mira desperta pouco depois das 4h para fazer o café. Sai de casa às 4h45m e, muitas vezes, faz a primeira refeição na pista. Em média, vende quatro garrafas pela manhã. Como o dinheiro não é suficiente, à tarde ela sai para vender pipoca nas ruas. Adora o contato com o público, mas sonha com o dia em que terá um trabalho fixo, de carteira assinada.
Via Extra
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